Quem já leu algo aqui nesse blog mal nutrido, sabe que hoje é aniversário de morte do meu pai. E sinto uma saudade arrebatadora dele, como pai e melhor amigo. Ele era um homem incrível ─ sei que é muito abrangente, mas é o que temos para hoje. Também era apaixonante e é esse o adjetivo que vou explicar melhor.
Por duas vezes me apaixonei, aprendi a amar e respeitar meu pai. Como primeira filha tive sua atenção exclusiva nos primeiros anos. Ele era meu cúmplice: sempre tomava meu partido quando minha mãe relatava algum malfeito; me dava comida escondido ─ mesmo depois que eu já havia escovado os dentes ─; quando me deixava na aula ficava na mesma posição na porta da escolinha, só para eu me sentir tranquila e segura quando entrava e saia do colégio novo.
Cantava para eu dormir “ô coisinha tão bonitinha do pai” (o amor é cego, como disse algum sábio). E quando eu estava brava com minha mãe ele recitava: “Meu cavalo e minha mulher morreram no mesmo dia, do cavalo tive pena, da mulher tive alegria, cavalo bom é difícil, mulher eu acho todo dia” ─ sei que é misógino, cruel e tal, mas me acabava de rir vendo minha mãe revirando os olhos de tédio com esse repente.
Em algum momento da minha infância, que não sei precisar, ele desapareceu. Coisas da vida de adulto que só competem a eles e que não tinha maturidade para lidar na época e que não me interessam agora.
Ficamos eu e minha mãe sozinhas. Passamos alguns apertos: perdemos nossa casa, nossas coisas… Minha mãe precisou trabalhar e eu aprendi a me adaptar. Tivemos apoio das famílias, mas esse vazio ficou.
O tempo passou.
Um dia apareceu esse moço, beijou minha mãe na boca. Como, do nada, aparece esse homem? ─ Larga ela moço!
Memória é um troço confuso quando envolve emoções. Não sei vocês, mas a cronologia se perde em minha mente. Não sei o quanto demorou, só sei que foi assim: me apaixonei e amei esse moço pela segunda vez.
Há onze anos ele se foi de novo, dessa vez para sempre, mas isso é assunto para outro dia.
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